Diário de viagem, quase estrelar. Minha conversa com vocês neste espaço vai ser interrompida. As malas que estavam prontas, umas por não terem sido desfeitas e outras por estarem arrumadas para uma nova vida nas terras de Mao, serão desfeitas por completo.

Tudo muda o tempo todo e a vida segue nos dando presentes e/ou pregando peças. Desafios profissionais me prendem no Brasil e assim volto da China.

Sigo nas minhas entrevistas com chineses aportados no Brasil. Desta vez, falei com o senhor Wen, mas que aqui na terra do carnaval, do futebol (para os alemães), das panelas seletivas, dos estupros não punidos, atende pelo nome de Antonio.

A pergunta que abre as conversas com os imigrantes chineses sempre é a mesma:
•    O que veio fazer no Brasil?
Já ouvi as mais diversas respostas, mas sempre alinhavadas pelo conjunto, liberdade, oportunidade, amor e dinheiro. Mas senhor Antonio responde de maneira muito singular:
•    Vim matar a saudades.
•    De quem? Do quê?
•    E eu sei lá, eu tinha uma saudades de algo que eu não sabia. De uma coisa que meu coração desejava e nem eu mesmo sabia.
•    Resenhe sobre isso, senhor Antonio.
•    Você tem tempo? Acredita na intensidade da vida?

Eu fico sem palavras, o jovem senhor que em seu país era médico, aqui trabalha há 10 anos como atacadista. Tem uma energia muito especial. Parece estar sempre a filosofar, sempre termina suas frases com uma pensata que nos faz refletir.

Me perguntou qual era a minha saudades, o porquê fui para China e o porquê voltei. Expliquei segundo as notas oficiais sem entrar em detalhes. Ele inquieto pergunta:
•    Quando foi, foi mesmo?
•    Não sei ao certo. Achava que sim, mas para dizer a verdade não sei mesmo se fui. Vivo por tantos lugares que não sei se chego em tempo, junto com o meu corpo.
•    E voltar, já voltou?
•    Hoje posso dizer que sim. Para dizer a verdade ao senhor, meu corpo chegou ao Brasil faz quase dois meses, mas hoje chegou todo o resto. Agora estou aqui.
•    Por isso esse sorriso em seu rosto.
•    Me diga uma coisa, rapaz. Seu nome não é Toni, não é mesmo?
•    É e não é. Sou Toni desde pequeno e na vida profissional sempre fui Toni Pires, mas me chamo Antonio.
•    Ah, entendo. Vou te contar…

Falamos por mais de duas horas. Ele explica que escolheu o nome Antonio ao chegar ao Brasil e hoje não se reconhece por outro nome, mesmo Antonio existindo por somente uma década. Tem momentos na vida de um homem, que por mais que o mundo pareça desabar e mil tarefas ele tenha que executar, só uma coisa é que importa:
•    Encontrar o seu Antonio.
Falo um pouco de mim e por que voltei e arrisco dizer:
•    Acho que entendo o que o senhor me falou no início da nossa conversa. Voltei por uma saudades que nem eu sabia que tinha. Meu coração precisava sonhar e na China eu não conseguia. Agora vivo um sonho.
•    Então meu rapaz, saiba que está prestes a virar um senhor e saiba que você voltou para ser Antonio.
Só consegui dizer que ele era uma pessoa muito especial. Terminamos a entrevista em um profundo e respeitoso silêncio. Ambos com sorriso maroto no rosto. Quando estava para sair ele me diz:
•    Pare de morrer de saudades. Viva de saudades. Não são os sonhos que nos movem, mas as saudades do que não sabemos querer.
•    Palavras assimiladas.
•    Só mais uma coisa. Vai ficar por aqui?
•    Não sei, mas uma coisa eu posso garantir. Por onde eu for, é Antonio quem vai.
•    Zàijiàn
•    Vou ser feliz e já volto…

Estas entrevistas vou continuar a dividir com vocês no meu blog pessoal. Fica aqui meu agradecimento e respeito a vocês que me acompanharam, leram, riram, choraram, gostaram e odiaram minhas letras emparelhadas.

Viver é compartilhar, e dividir com vocês minhas experiências no “continente vermelho” foi um prazer e uma honra.

Aos amigos de redação que sempre me ajudaram nesta empreitada, que me abriram espaço e confiaram:
– XIÈXIÈ.Post 31.05-1